Entrevista a Anchidim Pop - 'Dinu'
«Sinto-me cheio de energia, não me sinto diferente»
Nome: Anchidim Pop (“Dinu”)
Idade: 27 anos
Naturalidade: Roménia
Atividade profissional: Atendimento - União das Freguesias de Poceirão e Marateca
O dia em que a vida mudou
«Cheguei a Portugal em 2012, para tentar trabalhar e ter uma vida melhor. Comecei a trabalhar na agricultura e depois nas florestas, onde tive o acidente, no dia 3 de junho de 2014, aos 21 anos. Caiu uma árvore sobre mim e fiquei paraplégico.
No início foi muito complicado. Fiquei com uma lesão na coluna e fiquei internado durante três semanas no Hospital de S. José, onde fui operado. A recuperação foi feita no Hospital Curry Cabral, onde estive quase quatro meses. A 10 de outubro de 2014, no dia dos anos do meu irmão, tive alta.
Tive o apoio do meu irmão, da minha mãe, da minha família. Sinceramente, sem o apoio deles, não sei se conseguiria superar toda esta situação.
Durante dois anos e meio, ajudaram-me também com a parte financeira. Quando tive o acidente de trabalho, não tinha seguro. Fui para tribunal, com a ajuda da Associação Nacional dos Deficientes Sinistrados no Trabalho, e o meu processo ficou concluído em março de 2017. Fiquei com uma pensão vitalícia e consegui ficar cada vez mais independente. Comprei um carro, que era mesmo uma necessidade.
Fiquei em casa, continuei com a fisioterapia na Santa Casa da Misericórdia de Palmela, três vezes por semana, mas sair só para fazer fisioterapia e ir às compras era uma monotonia. Precisava de alcançar muito mais».
Uma nova família na Junta de Freguesia de Poceirão
«No início de 2018, tive a iniciativa de começar a procurar trabalho. Fui ao Centro de Emprego, tive uma reunião com uma diretora e, depois disso, passei a ser acompanhado pela APPACDM de Setúbal.
Pensei que, sempre que tinha precisado de enviar documentos por e-mail para o meu advogado ou para a Associação dos Deficientes Sinistrados, ia à Junta de Freguesia de Poceirão e as funcionárias eram sempre simpáticas e ajudavam-me a fazer o envio da documentação. Entretanto, tive a ideia de tentar integrar-me na Junta de Freguesia.
Comecei, no dia 19 de março de 2018, um Estágio de Formação, que durou até ao fim de maio, e correu tudo bem. As minhas colegas e a Presidente da Junta apoiaram-me muito e senti-me muito bem. Claro que, no início, tinha muitas dificuldades em compreender e também em falar português mas, com o tempo, conseguimos ultrapassar essa situação.
No início de junho de 2018, comecei um contrato CEI+ através do Centro de Emprego, durante um ano, e consegui aprender cada dia mais, ter mais conhecimentos relativamente ao trabalho de atendimento ao público. Em julho de 2019, comecei a trabalhar a recibos verdes e, entretanto, abriu um concurso e fiquei efetivo na Junta, em maio de 2020.
Agradeço às minhas colegas e à Presidente da Junta pela confiança. Consegui integrar-me, consegui encontrar uma família aqui na Junta. Sempre que preciso de algum apoio, elas ajudam-me».
A vida ativa com o andebol
«Frequento o ginásio e estou a praticar andebol em cadeira de rodas desde dezembro de 2018, no Independente Futebol Clube Torrense, na Torre da Marinha, Seixal, onde também temos jogos no Campeonato Nacional.
Gosto muito, gosto de competição, dos jogos, dos treinos. É mesmo um desporto em que consigo libertar a minha a cabeça, relaxar, esquecer-me de todos os pensamentos e ficar focado».
A aventura de conduzir até à Roménia
«Atualmente, vivo sozinho, na Asseiceira, e a minha família está toda na Roménia: os meus pais, o meu irmão, a minha irmã e dois sobrinhos, com os quais mantenho a ligação. Vamos falando quase todos os dias.
Fiz a primeira viagem para a Roménia sozinho com o meu carro em março de 2017. Foram 3.300 km, uma viagem muito comprida. Estava bastante cansado, mas como gosto muito de conduzir, para mim foi uma aventura e consegui chegar ao fim sem dificuldades nenhumas. Entretanto, já fiz uma segunda viagem, em junho do ano passado».
O compromisso de melhorar a cada dia
«Gostava de fazer uma formação para melhorar o meu português, escrito e falado. A nível profissional, gostava de, a cada dia, aprender mais e melhorar o meu atendimento e a minha forma de trabalhar na Junta de Freguesia. Entretanto, vou tentar tirar formações, a cada oportunidade, para melhorar o meu currículo».
Um verdadeiro modelo inspirador
«Aceitei o que me aconteceu, não tinha outra hipótese. Claro que no início era mais complicado. Quando ia às compras, tinha a sensação de que todas as pessoas ficavam a olhar para mim. Mas o passado já é passado, já me acostumei e esta cadeira de rodas já faz parte de mim, é a única forma de me deslocar.
Sinto-me cheio de energia, não me sinto diferente. Foi um obstáculo difícil de ultrapassar com 21 anos mas, por outro lado, penso que já andei, joguei futebol, corri, já fiz tudo e então não sinto tanta tristeza, porque já sei como é fazer todas essas coisas.
Com a participação neste projeto, vou tentar inspirar outras pessoas».